terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

Os 70km mais dificeis da minha vida!!!!

Para todos aqueles que correm ultras, existem corridas epicas. Umas por causa da beleza, da altitude, da desolacao, ou simplesmente por que eh muito bom corre-las. A Brazil135 por exemplo, eh uma dessas corridas que voce quer estar lah, nem que seja soh para encontrar velhos amigos.
A Arrowhead eh uma corrida epica em muitos aspectos. Desde que cheguei aqui nos EUA, na ultima quarta-feira, tenho tentado aprender e memorizar o maximo de detalhes sobre como correr em condicoes tao adversas. Sao pequenos detalhes, que podem salvar sua vida: como nao deixar congelar sua agua, o que fazer quando voce para por alguns minutos com temperaturas que podem facilmente chegar a -30oC, como aquecer suas maos e pes, o que comer, o que congela, o que nao congela, onde parar, enfim, pequenos detalhes que fazem todas a diferenca.
Convidei um amigo muito querido pra correr a Arrowhead. Seu nome eh Douglas Girling. Doug eh da Africa do Sul, mas mora nos EUA ha algum tempo. Ano passado Doug completou a 6633, uma corrida de 120 milhas no Artico. Eu achei que talvez a Arrowhead fosse mais uma boa corrida pro Doug praticar suas novas habilidades como ultramaratonista (sua primeira ultra foi a Sahara Race 2008, onde nos conhecemos).
O comeco da Arrowhead pra mim foi um fiasco. Antes da prova comecar, meu treno quebrou e tive que conserta-lo pra tentar sair antes das 7h30 (a corrida comecara aas 7h00). Fiquei um bom tempo correndo sozinho, sem ver absolutamente ninguem a minha frente. Esse tipo de corrida eh extremamente solitaria. O tempo todo eh praticamente voce e a natureza selvagem. Fiquei bem surpreso quando cheguei ao primeiro abrigo (10 milhas) em aproximadamente 3 horas. Mas estava muito frio (-35oC), conforme fui avisado por um dos oficiais da prova, que estava lah pra checar se todo mundo estava bem.
Apesar de estar muito dificil eu tentava andar o mais rapido possivel, e correr um pouco quando sentia muito frio. Soh descobri que eu nao era o ultimo corredor apos o km 20. TJ, um corredor da Samoa me alcancou e ficamos conversando um pouco. Ele me disse que era triatleta e escalador de montanhas (completara os 4 Summits: Kilimanjaro, Aconcagua e outros 2 que nao me lembro). Embora nunca tivesse tentado uma corrida maior do que 50 milhas, estava correndo a Arrowhead como sua primeira ultra-experiencia.
Aaquela altura nao tinhamos a menor ideia de como os corredores estavam se saindo, pois na Arrowhead voce nao tem nenhum acesso aas informacoes da prova. Os celulares nao pegam, nao ha postos de radio, enfim, a unica forma de obtermos alguma informacao eh atraves dos snowmobilers, que vem e vao o tempo todo, tentando "trackear" o maior numero de atletas possivel.
Na milha 20 tudo comecou a mudar. Eu percebi que estava gastando uma quantidade enorme de energia pra manter minha velocidade. Eu estava usando "track poles" que sao uma especie de varetas de apoio, muito comum em corridas de aventura, mas que eu nunca havia usado antes. Alem disso, estava carregando uma mochila com 3 litros de agua no camelback e meu musculo do trapezio comecava a dar sinais de exaustao.
Antes da Arrowhead eu havia feito um treino de 24horas, (na verdade 23h35min) onde completei 100 milhas e me sentia confiante do ponto de vista da energia necessaria para o endurance. Mas eu nao estava preparado pra fazer tanta forca nas pernas e nos bracos com fiz. Soh posso dizer que correr/andar na neve gasta provavelmente 3 ou 4 vezes mais energia do que numa corrida normal. Mesmo com minha previa experiencia com severa privacao de sono (50 horas ou mais) com 11 horas de prova eu estava praticamente dormindo na estrada e nao eh nada engracado dormir numa trilha de snowmobile, ouvindo os lobos uivarem na noite, logo atras de voce.
Eu estava sem energia, sem stamina, sem nenhuma vontade de continuar caminhando, mas aqui voce nao tem opcao. Continua caminhando, lutando a cada subida, a cada curva e rezando pro proximo checkpoint estar proximo. As ultimas milhas antes do 1o checkpoint foram brutais. A noite chega cedo aqui (5 da tarde) e fica ainda mais dificil e mais frio quando anoitece.
Pra minha sorte havia outro corredor comigo nessas ultimas milhas (Sean) e viemos conversando um pouco. Sem sua ajuda eu provavelmente nao teria encontrado a entrada correta pro 1o checkpoint e teria me perdido noite adentro.
Quando cheguei no primeiro checkpoint encontrei o Marco Farinazzo que chegara umas 2 horas antes de mim. Ele estava me contando como havia sido dificil pra ele fazer a prova ateh ali, e que essa prova era muito mais uma questao de forca nas pernas e bracos do que de endurance (resistencia). Ele havia comido alguma coisa e nao sabia ao certo se iria continuar ou nao. Eu tambem nao sabia se iria continuar. Tomei duas sopas quentes, comi um cachorro quente e um sanduiche, mas logo comecei a tremer de frio. Minha roupa encharcada havia ido pra secadora e eu estava soh com as roupas de baixo. Um dos oficiais da prova me ajudou a lidar com a hipotermia. Eh bem engracado o quanto de energia a gente gasta quando o corpo, hipotermo, tenta se aquecer. Logo eu estava mais exausto do que antes. Nao tinha forcas nem para reclamar de nada. Lembro do Farinazzo acenando pra mim e me desejando boa sorte. Eu dei um abraco nele e ele partiu por volta das 21h00. Eu sabia que ele iria sofrer muito pois a noite eh muito dura e se voce parar pra descansar, tudo pode piorar. Sempre tento ser muito consciente nas minhas decisoes. E sei que parte do ultra-esporte eh voce ir alem dos limites, estabelecer novas fronteiras no desconhecido. Mas eu tambem sei quando eh hora de parar. Sem experiencia previa com o frio e a neve, sem saber como lidar com algum problema inesperado que poderia me atingir no meio do caminho e com mais 55km pela frente ateh o segundo checkpoint eu decidi que minha corrida havia terminado ali.
Eu agradeco muito aos meus patrocinadores (Subway, Capital Steakhouse, Drogaria Santa Marta, Quatro Estacoes e aos amigos, que preferem permanecer anonimos) por terem confiado em mim, mas desistindo ali eu teria certeza que poderia tentar novamente numa proxima oportunidade.
Depois de uma boa noite de sono estou de volta  aa Arrowhead pra checar como estao os outros corredores. E ateh agora o que posso dizer eh que o Jarom fez o maximo, mas nao conseguiu terminar a prova. Um snowmobiler o resgatou aas 2h00 da manha. o Raymond Sanchez deixou o segundo checkpoint aas 11h00 (aprox.) e parecia bem confiante. Iso havia saido bem cedo do 2o checkpoint tambem.
Encontrei o Farinazzo em Melgoerges e ele estava muito cansado. Dormiu por algumas horas e deixou o 2o checkpoint aas 17h23. Nao eh comum alguem finalizar a prova deixando o checkpoint tao tarde, mas vindo do Farinazzo tudo eh possivel. Ele tem uma resistencia incrivel e sabe lidar com as adversidades muito bem.
Sao 19h11min, estou na linha de chegada tentando obter mais informacoes dos corredores. Quem estah liderando a prova ateh agora eh o Zach Gingerich (3o lugar na Badwater 2009). Zach deu muito trabalho para o Farinazzo na ultima Badwater, mas parece que esta eh a prova ideal pra ele ter seu momento de gloria.
Vamos aguardar, pois essa eh uma das provas mais dificeis do mundo e certamente, pra mim, a mais dificil de toda minha vida.

2 comentários:

  1. Valeu Rodrigo,

    nos da Ilimitada continuamos com a torcida por vc. Depois de noticias.

    Abs

    Marcos

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  2. Valeu cada passo seu aqui no FREEZER da America!!! Nao desistimos, so aprendemos e aperfeicoamos! You are the man just for coming here again to face the world's toughest challenge!!! Seu brother, Jarom

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